quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O indizível

Tanta coisa a dizer depois de tanto tempo. Tanta que se esfarela em nada. E a quem interessaria ouvir mais um som de experiência incomunicável? Haverá mesmo um alguém do outro lado desse imenso confessionário? E se houver, para que acrescentar mais palavrocas à ruidosa surdina virtual? Não será melhor calar, se recolher à surdez humana?
Mas tenho um blog em branco e à espera. Do quê, desconheço. Então perambulo nas pequenas memórias soterradas de um mês. A praia em chuva, o desfile de carros, gentes e cães na ecologia da virada de ano, a virose que afasta o sabor da salivada paella, o shopping, os laptops e celulares beira-mar, o shopping lotado da periferia interiorana, o shopping lotado da classe média provinciana, o shopping lotado dos manos paulistanos. O garoto que sem querer mija nas calças diante do lanche e da mãe furiosa. E o terror do garoto com o brinquedo de plástico e o hamburguer emborrachado.
Nem direi nada dos livros que me mataram impiedosamente um dia, outro dia, ontem e hoje. Não, não direi que eles me levaram bem longe da vida esfuziante dos fantasmas. Direi somente que, na falta de alguma nova harmonia que me desse a sensação extraviada do silêncio, comprei um CD de Jards Macalé, o velho de guerra com o cigarro aceso no fundo do palco(?)mundo. Só porque ele cantava Ne me quitte pas, canção que de vez em quando deixo aqui de voz em voz para quem sabe que alguma melodia pode haver no universo. Aquela que interrompe o indizível e o incomunicável.

6 comentários:

  1. Nosso Tempo
    [Drummond]

    (...)
    Em vão percorremos volumes,
    viajamos e nos colorimos.
    A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua.
    (...)
    Calo-me, espero, decifro.
    As coisas talvez melhorem.
    São tão fortes as coisas!

    Mas eu não sou as coisas e me revolto.
    Tenho palavras em mim buscando canal,
    são roucas e duras,
    irritadas, enérgicas,
    comprimidas há tanto tempo,
    perderam o sentido, apenas querem explodir.
    (...)

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  2. Oi, professor Antônio. Escrevi uma tese sobre Marco Zero de Oswald de Andrade e utilizei seu trabalho sobre esse livro. Cheguei até a fazer uma qualificação na UNICAMP, mas a professora Maria Eugênia Boaventura retirou-se para se aposentar e fiquei a ver navios. Gostaria de enviar essa tese para vc. Meu e-mail é lucio@bdoline.com.br

    Aguardo sua resposta!

    Abs!

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  3. Cá estou novamente a ler seu rico post.Tanta palavra rica,tanta coisa dita nas entrelinhas.Gosto muito do seu espaço.Um abraço!

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  4. As coisas do ocio são cansadas como o trabalho... vão comendo mesmo todo o tempo

    não é bem assim "existe alguem ai fora?", mas "existe alguem aqui?"

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