quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Sob a chuva vermelha

A volumosa chuva sobre o Anhembi na última segunda feira à noite não afastou as dezenas ou centenas de milhares de pessoas presentes no último comício da campanha de Dilma e Mercadante. Eu também estava lá a observar aquela multidão na maioria negra, mulata, pobre, periférica com suas bandeiras agitadas. E enquanto aquela massa compacta se estreitava, cantava e gritava com sincera espontaneidade, tão diferentemente dos blocos comandados de cabos eleitorais comprados pelos partidos sem gente de verdade, eu dialogava com meus demônios imaginários.
E achei bonito o reencontro da nação com sua história, reencarnada no Estado social trabalhista, única via de emancipação do Brasil e do seu povo. Digam o que disserem, evoquem as novas teses subjetivistas, voluntaristas e elitistas da história, proclamem as virtudes do neocapitalismo verdedesign da natura,  permanecerei eu sob essa chuva vermelha.

domingo, 26 de setembro de 2010

Marina, a queridinha da direita

Hoje transcrevo matéria da Carta Maior sobre as últimas estratégias da direita para evitar a vitória de Dilma. Nesta última semana as tentativas golpistas avançam. Devemos estar atentos. Peço que leiam o texto abaixo:


A bala de prata era verde

da Carta Maior


A direita brasileira raspou o fundo do tacho e chegou à seguinte conclusão: Marina é o último cartucho de Serra. Todas as pesquisas divulgadas até a 6º feira convergem para um ponto de equilíbrio sedimentado: Dilma tem 50% das intenções de votos (oscilou apenas um ponto depois de toda fuzilaria das últimas duas semanas). Serra patina em torno de 25%. Parece difícil ir além por suas próprias ‘qualidades’. Depois de tudo o que tentou, a boa vontade estatística, leia-se, o versátil Ibope do transformista Carlos Montenegro, lhe deu uma oscilação de amigo do peito de 3 mais pontos. Anima a militancia da página 2 da Folha, mas é insuficiente. Para levar a eleição ao 2º turno, resta ao conservadorismo nativo pintar-se de verde e bombar Marina Silva pelo ar, por terra e por mar, 24 horas por dia nos próximos oito dias. O mutirão já começou. Faz parte desse tour de force, por exemplo, a retardatária adesão do neoecologista Pedro Simon à candidatura do PV, nesta 6º feira. O movimento ambientalista brasileiro encontra-se diante de uma encruzilhada histórica: tem oito dias para decidir se integra o campo de forças que lutam pela transformação do Brasil numa sociedade mais justa e sustentável, ou, ao contrário, como lamentavelmente sugere o comportamento de alguns de seus porta-vozes e lideranças lambuzadas com a atenção da mídia, se assume a condição subserviente de pé-de-palanque da direita e da extrema direita unidas no interior da coalizão demotucana. Chico Mendes por certo não hesitaria em escolher seu lado se na reta final de uma disputa política, como agora, tivesse objetivamente duas opções de poder: um governo amarrado em torno dos compromissos históricos de Dilma e Lula ou um Brasil submetido ao comando da alarmante dupla Serra e Índio da Costa. Resta saber qual será a escolha de Marina Silva. A ver.

(Carta Maior, 25-09)

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Intelectuais de volta ao passado

Agradeço muitíssimo às amigas e amigos que comentaram minhas opiniões impressionistas do post anterior, ainda que eu discorde de um ou de outro. Meu interesse maior no blog não é a política. Gostaria de voltar aos assuntos que me são mais caros: o mundo atual como espetáculo deprimente (incluindo a política), a subjetividade atônita e a perplexidade filosófica dos nossos dias, a arte como vida autêntica. Mas entre tudo isto e a realidade cotidiana há um buraco terrível, quase intransponível. Por isso tenho de voltar à carga:

Manifesto em defesa da democracia elitista: Leio no Estadão de hoje a íntegra do manifesto que será divulgado amanhã por um punhado de intelectuais liberais de São Paulo ligados a José Serra. O texto virá com as assinaturas de figurinhas carimbadas, algumas portadoras de inegável crédito intelectual, embora politicamente comprometidas e equivocadas, outras sem o mesmo prestígio ou simplesmente oportunistas. São elas: D. Paulo Evaristo Arns, cujo papel na luta contra a ditadura militar temos de reconhecer e aplaudir, ainda que não se possa ignorar seus vínculos políticos, eclesiásticos e civis, com o pensamento conservador; Ferreira Gullar, sobre o qual já falei antes e não perco mais tempo para tratar dele; os cientistas políticos José Álvaro Moisés, Bóris Fausto, Leôncio Martins Rodrigues e Lourdes Sola, conhecidos personagens do staff fernandohenriquista, reacionários até a medula; José Arthur Giannotti, filósofo guru do mesmo grupo;  Celso Lafer, liberal de carteirinha da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo; Marco Antonio Villa, historiador da causa perdida de 1932, restaurador dos mitos paulistas pré-históricos, funcionário contratado por Serra para dirigir uma coleção pró-bandeirantismo; e uns outros artistas da velha guarda. Não se espere que seja obrigatório a todo artista pensar. O teor do manifesto é de uma hipocrisia enorme, revestida de sinceridade democrática. Leiam amanhã.

A ditadura democrática da mídia: O príncipe dos sociólogos ressurge de quando em quando para nos civilizar. No mesmo Estadão do domingo passado ele se levanta do trono para solenemente dizer: "Uma das coisas que mais me surpreendeu (sic, eminência) na trajetória política de Lula foi a absorção por ele do que há de pior na cultura do conservadorismo, do comportamento tradicional (...). O PT quando foi criado se opunha ao corporativismo herdado do fascismo e de Getúlio Vargas. No poder, vemos que ele ampliou esse corporativismo". FHC, PSDB e seus intelectuais orgânicos, aliados ao moderno, civilizado e democrático DEM e à mídia financiada golpista, simplesmente temem a democracia de base popular, única forma que, historicamente, pode promover reformas sociais na América Latina. As velhas questões da democracia social, recalcadas pelo superego civilizado e moderno, estão de volta. Assustado, o superego tentará o golpe? Quem o apoiará? Os militares, a classe média, as senhoras católicas das cavernas? Não creio.

O sonho e a realidade de Marina Silva:  Cabocla bem-formada nas lutas do PT, Marina Silva não se conteve dentro de si mesma, foi incontinente. Egóica e apressada, incensada pelas ONGs internacionais, não teve a paciência de articular políticas de desenvolvimento sustentável à política social de urgência e premência para o país, experimentada a partir do governo Lula. Rendeu-se ao discurso oco dos verdes nacionais, modernos de superfície. É uma pena que tenha caído nessa cova de leões sem rumo.

A visão de Deus: íntegra das palavras pintadas no papelão de cobertura do mendigo que mora aqui perto de casa, o mesmo ao qual me referi no antepenúltimo post: "Só uns come, outros não pode come. Só Deus. Voce não tem visão?". Remeto esta pergunta a Marina Silva, defensora da política de desenvolvimento sustentável. Não é preciso alguma resposta de Serra, já a conheço de cor, apesar das suas últimas investidas desesperadas - estas, sim, demagógico-populistas, como a promessa insustentável de aumento do salário mínimo. 

domingo, 19 de setembro de 2010

Saudade da Nara Leão e outras observações políticas

Meu amigo Cezinha quer me colocar no fogo: pede minha opinião sobre os últimos lances da disputa eleitoral. Seu pedido é uma ordem, mesmo que a cada post político eu perca um seguidor (prefiro a palavra comparsa). Mas que ele não espere alguma análise imprescindível ou algum dossiê novo. Não sou cientista político nem jornalista. Minhas opiniões sobre esse tipo de assunto são sempre impressionistas. Então vamos lá:

O significado do lulismo: Não adianta a oposição espernear. O Brasil vive hoje um novo ciclo político cujas raízes vêm lá do varguismo. Pouca gente admite isso, principalmente alguns petistas que ainda pensam o PT a partir da sua matriz dos anos 80, sedimentada na tese da autonomia dos movimentos sociais. O PSDB, herdeiro do udenismo e do velho liberalismo paulista pré-30, apostou tudo na desmontagem do projeto de Getúlio. FHC foi o maior guru desse grupo que só faz criticar o Estado forte e o suposto populismo ignorante da América Latina. Pois ficarão sepultados por um bom tempo, tendo em suas tumbas a companhia moderna e civilizada dos coronéis de terno ou farda. Se quiserem saber mais sobre esta interpretação é só ler o magnífico artigo de André Singer na Ilustríssima da Folha de SP de hoje (as pérolas também podem brilhar no chiqueiro): A história e seus ardis. Em sua análise, Singer explica de forma inteligente o realinhamento de forças ocorrido sobretudo no segundo mandato de Lula, que propiciou "a aliança entre a burguesia e o povo, que ninguém mais achava que pudesse funcionar". Segundo ele, trata-se de um fenômeno semelhante ao que aconteceu com o New Deal de Roosevelt, que determinou "o andamento da política por um longo período". Dilma, não por acaso vinda do PDT brizolista que por sinal veio do PTB varguista, é a sucessora adequada para lhe dar prosseguimento. E não me venham com as histórias bobas da elite de nariz torcido para o que chamam de populismo!

O golpismo não é novidade: A história serve, pelo menos, para relembrar aquilo que fica debaixo do tapete. Por exemplo: a campanha do corvo lacerdista contra o suposto "mar de lama" no último governo Vargas, na verdade, uma aliança cada vez mais nítida com os segmentos populares e os grupos nacionalistas; a sublevação mal-sucedida de Jacareanga contra JK; a tentativa de impedir a posse de Jango e, afinal, o golpe vitorioso de 64, arquitetado pelos mesmos atores e as mesmas ideologias. A invenção do mensalão, quarenta anos depois, seguiu idêntico script, mas não deu resultado. Dias atrás atribíram ao PT os dossiês de invasão da receita federal criados no intestino do próprio PSDB, quando do embate Aécio-Serra. Ao fazê-lo, cobriram de véu a Verônica da semana santa, Eduardo Jorge e outros que, dizem as más línguas, estiveram nos navios da privataria fernandista. E agora jogam o último lance, espero que suicida, ao darem voz a um notório vigarista recem-saido da cadeia. Em 25 de agosto de 2005, no auge da escalada para derrubá-lo, Lula respondeu: "Nem farei o que fez o Getúlio Vargas, nem farei o que fez o Jânio Quadros, nem farei o que fez o João Goulart". Lula sairá outra vez por cima. Com o povo. É simples assim.

Que orgulho da nossa imprensa livre!: O governo tucano de São Paulo assina jornais e revistas da imprensa golpista e os distribui em todas as escolas públicas com o pretexto de promover o acesso das crianças e jovens à leitura. Nada disso. O que está em jogo nesse e em outros contratos milionários é a troca de favores políticos. Por isso as manchetes diárias do PIG contra Dilma e o PT. Por isso os factóides cotidianos. O que mais virá até 3 de outubro? Sempre haverá um coelho na cartola. Espero que morto, amigos ecologistas! De livre essa imprensa não tem nada. Se é para defender a liberdade de imprensa, que todas as cartas estejam na mesa. E não apenas às vésperas da eleição, quando não há tempo para formar a opinião verdadeiramente pública.

A santa evangélica de pau oco: Primeiro, Marina fez coro à Serra, foi sua coadjuvante. Agora, tenta caminho próprio e vai tirar uma parcela dos seus votos, mas poucos de Dilma. O seu eleitorado será a classe média reginaduartemente assustada ou envergonhada de Serra, que inclui também alguns componentes da elite dita intelectual. Qual é mesmo o projeto de Marina? Abrir nossas fronteiras para todas as bem(mal) intencionadas ONGS internacionais? Estimular o capitalismo-design-natura-virtual-moderno à moda do paulista Feldman? Quantos empregos vai gerar com esse pseudo-ecológico-evangélico capitalismo? Muitos dos meus colegas intelectuais historiadores acreditam nessa coisa. Sempre fora do mundo real!

Que saudade da Nara Leão!: Quando leio a coluna da Danuza Leão - o que faço só uma vez por ano e com o nariz tapado -, sinto enorme saudade da sua irmã. Daquela voz suave, daquela opinião generosa. Danuza, ao contrário, é reaça de mais e inteligente de menos. Por que não se limita a falar de etiqueta em vez de dar palpites políticos idiotas? Outro que me irrita, mas só esporadicamente quando decido perder tempo com suas crônicas, é Ferreira Gullar. Confesso que não gosto dos seus poemas, com exceção de uns poucos, como Luta corporalPoema sujo. Quanto às suas notas políticas, acho-as abomináveis. Expressão de puro ressentimento dos velhos comunostalinistas, atualmente liberais sempre às voltas com o passado recalcado, sob o manto do liberal PPS. Na coluna de hoje, Gullar foi longe demais ao acusar o PT do assassinato do prefeito Celso Daniel. Ex-stalinista é assim mesmo. Projeta nos outros os próprios crimes conscientes ou inconscientes. Que continue a escrever poemas, com o perdão da liberdade poética. Mas não me tenha entre seus leitores. Tou fora.  

sábado, 18 de setembro de 2010

Procura da arte

Tem muita gente procurando a arte por ai. Hoje tive contato com três maneiras de buscá-la. Não sei se bem-sucedidas. Mas é o que menos importa.
A primeira foi na porta do cinema. Um carinha que sempre me parava pra vender seu livro finalmente me convenceu. Peguei vinte reais na carteira e comprei seu romance (será que é?) Suite zero - opus noturnus. A edição é do próprio autor, um rapaz de uns vinte e poucos anos, inspirado em Rimbaud, que pagou do próprio bolso a tiragem de cem exemplares que ele mesmo vende com muita lábia. Figuras desse tipo sempre existiram. Ainda bem. Os verdadeiros artistas geralmente fazem um caminho tortuoso.
A segunda foi dentro do cinema. Meio por acaso fui ver Baarìa: a porta do vento, de Giuseppe Tornatore, o consagrado diretor de Cinema Paradiso. O filme narra diversos momentos da história italiana do fascismo à caótica atualidade. A trama gira em torno de Peppino, que passa a vida na militância comunista, sem saber o que dizer do mundo na velhice. Baarìa tem imagens belíssimas, música impecável (de Morricone, óbvio), emoção e humor meio programados. Parte da crítica não gostou, principalmente porque o filme foi financiado pela empresa cinematográfica de Berluscone. Sai da sala e ainda não firmei um juízo definitivo sobre a obra. Mas que lá tem uns lances de boa arte, tenho certeza!
A terceira se passou a muitos quarteirões do cinema. Muitas vezes eu já tinha visto aquela cena e só hoje prestei mais atenção. Um mendigo sempre deitado na calçada perto da banca de jornal. Nenhuma novidade nisso. A diferença é que ele criou uns letreiros em papelão à sua volta. Escritos em letra de forma caprichada, com alguns erros de português, funcionam como legenda da sua condição. Uma das suas chamadas poderia até ter efeito de choque, caso alguém ainda se chocasse hoje em dia com alguma coisa: "Tenha visão!". 
Acho que, dos três autoress citados, o mendigo foi o que mais chegou perto da arte da vida.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Em memória dos partidos defuntos. No dia da autoflagelação de Cláudio Lembo, o representante da elite branca

Em memória dos extintos PSDB, DEM, PPS, PV, PIG e outros partidos de aluguel, posto aqui a metralhadora de mágoas de Cazuza. Que chafurdem na piscina cheia de ratos: 

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Essa marrom é fudida!

A Marron é demais. Fudida. Vozeirão que invade o mundo. Gorda possante. Popular, pop. Um dia será cult. Os babacas da classe média intelectual torcem o nariz diante dela. Mas ela é samblues, jazzpagode, afrobolero. Veio do Maranhão, como Zeca Baleiro, outro massa. Maranhão é mais que Sarney, como diria meu irmão Zé Henrique Borralho. Nos states estaria por cima. Cá entre nós, é o povão que sabe dessa verdade. Curto Alcione. E deixo um dos seus hits pra emocionar esta página. Adiciono também sua declaração de voto na Dilma. Vejam abaixo:



sábado, 11 de setembro de 2010

Minha árdua semana da pátria

Vários dias ausente do blog e por razões justificadas. Enquanto outros gozavam os doces prazeres da semana da pátria, eu suava a camisa e consumia os parcos neurônios diuturnamente (esclareço este exagero logo abaixo) num congresso de História.
Já fazia algum tempo que, por falta de saco, eu não frequentava um evento acadêmico desse tipo. Mas voltei, como todo filho um dia volta ao seio materno e o criminoso à cena original do crime.
E simplesmente para concluir que quase nada mudou no palco científico, a não ser o fato de que os congressos proliferam cada vez mais. Os interessados não precisam gastar muito tempo para encontrar centenas de anúncios de simpósios, encontros, seminários, semanas, sejam regionais, nacionais ou internacionais.
Há de tudo um pouco: jornadas para médicos, físicos, químicos, biólogos, sociólogos, comunicólogos, cientistas políticos, antropólogos e, claro, históriadores. Os humanistas moles não precisam mais ficar ressentidos com os cientistas duros, uma vez que também têm à disposição seus próprios supermercados, shoppings e fashion weeks.
A diferença é que as barracas dos historiadores parecem mais pobres, talvez porque nossos produtos não tenham grande importância no comércio global. Nossas tendas estão mais para os camelódromos do que para os iguatemis luxuosos. A disparidade entre os congressos daqueles profissionais e os nossos é demonstrada já na distribuição dos badulaques do evento aos participantes. Enquanto eles recebem elegantes pastas de couro ou modernas mochilas para notebooks, nós ganhamos de entrada umas pastinhas baratas de plástico, equipadas com canetinha de ambulantes e um bloco de anotações comprado na gráfica da esquina.
Sei que isso é bobagem. O que importa é o conteúdo das conferências, das mesas redondas, dos seminários. Mas sobre tal não direi nada. Quem sou eu para julgar as centenas de trabalhos apresentados, que vão da análise dos escritos de Clarice Lispector às confissões íntimas do Padre Feijó? Como poderia discernir alguma coisa nessa massa de novas informações, metodologias e temas históricos culturais expostos pela multidão de novos especialistas, geralmente estudantes de pós-graduação, cada vez mais abundantes no mercado acadêmico?
Profissional velho de guerra, de um tempo em que se discutiam grandes teses acerca da realidade histórica, é difícil para mim opinar sobre esse verdadeiro turbilhão de pequenas dissertações culturalistas sobre não sei o quê e para quê. E não vai aqui qualquer crítica.
Ainda bem que não sou o único a falar dessa perplexidade. Lá mesmo no congresso, ao perambular pelas inevitáveis bancas de livreiros desejosos de algum consumidor de letras, comprei um livrinho de autoajuda acadêmica, no qual o autor - o best seller Zigmunt Bauman - trata da massa informe de conhecimentos em nossos dias:

"Essa massa de conhecimento acumulado transformou-se no epítome contemporâneo da desordem e do caos. Nela mergulharam e dissolveram-se pouco a pouco todos os critérios ortodoxos de ordenamento: tópicos de pertinência, atribuição de importância, necessidades determinantes de utilidade e autoridades determinantes de valor. A massa faz esses conteúdos parecerem uniformemente descoloridos. Pode-se dizer que, nela, todas as informações fluem com o mesmo peso específico; portanto, para aqueles a quem se nega o direito de reivindicar a competência de seu próprio julgamento, embora sejam expostos às correntes de teses contraditórias dos especialistas, não há como separar o joio do trigo. Na massa, a parcela de conhecimento retirada para uso e consumo pessoal só pode ser avaliada com base na quantidade, não é possível comparar sua qualidade com o restante. Todas as informações se equivalem".

Por isso, embora tenha frequentado as sessões do congresso, gostei mais de perambular pelos corredores e conviver com os amigos: antigos e novos alunos, orientandos, colegas e gente recém-conhecida. Nos corredores e nos botecos é que aprendemos a, pelo menos, saber como são realmente as pessoas, o que pensam e se vivem apaixonadamente como pensam, não como meros profissionais-mercadorias de supermercado. Semprei achei que esse é o melhor método de conhecimento.
E assim esclareço como foi minha árdua jornada na semana da pátria. Acho até que aprendi alguma coisa.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Sobre a vaidade 2

Em seu comentário, Marcantonio deixou uma máxima tão precisa sobre o tema do post abaixo que resolvi reproduzí-la aqui. Mas só em estado de supressão do superego, como acontece comid agora, nesta fantástica desglobalizada uma hora da manhã, se pode apreender o seu (b)embolado significado essencial. Ou, como diria Gil: "Abacateiro teu recolhimento é justamente o significado da palavra temporão Enquanto o tempo não trouxer teu abacate Amanhecerá tomate e anoitecerá mamão". Concordam comigo?

"[...]quanto maior é a vaidade de cada um, tanto é maior a sua aplicação: não estudam para saberem, mas para que se saiba que eles sabem; buscam a ciência para a mostrarem; o seu objetivo principal é a ostentação, e assim não é a ciência que buscam, mas a reputação; esta é como as outras, em que o adquirir é mais fácil do que o conservar." (Mathias Aires)

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Recado sobre a vaidade



"A vaidade é um princípio de corrupção." (Machado de Assis)


O destinatário desta frase tão sábia, com o qual sou fadado a cruzar de vez em quando nas escadarias marmorizadas e nas salas soturnas de um antigo prédio, cujo nome não posso dizer (por enquanto, só por enquanto), provavelmente não conheça nem leia este blog. E talvez nem saiba que a máxima acima pertence ao ilustre escritor brasileiro que, diante dos seus auditórios bajuladores, ele diz admirar. E se soubesse, pouco lhe faria em sua soberba incorruptível. Ou sequer alcançaria o sentido profundo, a sutil ironia e o elegante jogo de palavras contido em tão poucas palavras. Porém, como todos os caminhos levam a Roma, estas um dia em breve também chegarão ao destino. Simplesmente e sem alardes vaidosos. As palavras verdadeiras não se corrompem.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Enquanto piro



Fenix aterrisa
ajunta os galhos
e meticulosamente
ergue a pira

Ainda uma vez
contempla a cena
e ardentemente
acende o fogo

Assim como Fenix
termino e recomeço
Sobre as cinzas dos covardes
Vôo mais livre e forte