sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Pai, perdoe os pequeno-burgueses desencantados!

Um historiador, colega meu, que no passado se imaginou de esquerda mas nunca sujou as mãos por esse ideal, me disse estar desencantado com a política. Por isso decidiu votar em Marina Silva - segundo ele, a única candidata ética e moderna desta eleição.
Do alto da minha compaixão dalailamiana, respeito sua opção, embora considere por demais frouxos os seus critérios de escolha. Compreendo também porque a Madre Teresa de Araque ou Seringueira da Natura consiga arrastar votos da classe média dita intelectual. Ela representa bem a consciência arrependida de tal segmento. Radicais de grife, os intelectuais pequeno-burgueses precisam de uma bandeira pretensamente moderna e imaculada para aparar seu medo de mudanças sociais, seu preconceito para com os pobres. Ninguém melhor do que uma cabocla para canalizar esse sentimento, essa ideologia. Mas uma cabocla pobre ascendida ao mundo da classe média. Uma cabocla pobre mobralizada e dotada de um vocabulário irretocável. Já prestaram atenção na linguagem da Marina da Selva global? Por que o uso de um português tão escorreito, quase arcaico, ainda que tão artificioso e impopular? Distinção social de formato simbólico, diria o beato Pierre Bourdieu. Por que a imagem impoluta e os trajes rústico-assépticos de pastora? Mas, o que importa saber, sobretudo, é: o que fará ela na presidência, além de flexibilizar a legislação trabalhista (bandeira do PSDB) e de reciclar o capitalismo com a abertura de possibilidades ao empresariado ávido pela exploração de produtos maquiados de natureza?
Oh Grande Lacan! Derrube com seu sopro profano o frágil pedestal onde se ergue essa linguagem superegóica, esses instintos recalcados, essa ideologia mobralesca, essa moral de sujeita suposto saber!

Outro amigo meu, depois de um longo e tenebroso inverno, deixou no último post um comentário que aqui reproduzo:
"A Marina vai flexibilizar as leis trabalhistas. A Dilma não vai fazer a reforma agraria, urbana e nem passar a jornada de trabalho para 40 horas semanais. O Plinio não vai revogar o capitalismo com uma canetada. Só o Serra pode fazer alguma coisa: dar continuidade ao desmanche do Estado, dos serviços públicos, o que nos torna cada vez mais dependentes enquanto nação, retira direitos aos que ja não possuem nada... torna os ricos mais ricos etc etc".
Tenho de concordar com algumas das suas afirmações, mas discordo absolutamente da sua conclusão implícita: o voto nulo? Pois, evidentemente, todos os candidatos transitam no horizonte da reforma e não da revolução. Dilma, o PT e os aliados igualmente não propõem revolução. No entanto, retomam o projeto de um Estado social indutor do desenvolvimento nacional e distribuidor de renda. É pouco? Nada disso. Significa muito no caso brasileiro, tanto que desde 64 - e muito antes - os grupos retrógrados tudo fizeram para impedi-lo. As massas sabem disso.
Serra e Marina não se afastam dos postulados neoliberais do Estado mínimo, a segunda com fachada mais moderna. Plínio, disfarçado de radical, nada tem a oferecer a não ser um sonho de revolução pela caneta, na prática, um moralismo denuncista tipo Heloisa Helena, católico e evangelizador. Se fosse o caso revolucionário, prefiriria o o anacronismo do PCO, do PCB e do PSTU, não soubesse eu, por experiência militante num destes partidos décadas atrás, que eles não tem nada a propor além da ideologia. Ideologia como falsa consciência, isto é, negadora da realidade, da situação social objetiva, nacional e internacional, da correlação de forças, dos sonhos (inclusive de consumo) da população pobre no mundo hoje.
A pequena burguesia ideológica é assim mesmo. Anda sempre com um amparo suprarreal. Sinal de arrependimento, sinal de má consciência, sinal de conservadorismo.
Oh Santos Marx e Lênin, que tão bem compreendestes a face nefasta da pequena burguesia! Extirpai-a da história.
Oh Profeta Nietzche, que como ninguém denunciaste a covardia e o instinto de morte dos que se imaginam civilizados e conscientes da história!
Oh Salvador Supremo, perdoai-os, eles não sabem o que dizem!

3 comentários:

  1. Celso, achei que a Marina tava querendo pagar uma de Indira Gandhi com aquela roupinha! Discursinho completamente hiper-real, querendo adequar a realidade à fantasia do mundinho verde da cabeça dela. Será mesmo que ela acredita naquilo?

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  2. É
    pode ser que não exista realidade alguma fora da mente pequeno-burguesa
    nem um prazer que não o contrapeso da culpa pequeno-burguesa

    a fala é pequeno-burguesa
    qualquer esforço em imaginar um outro... este outro é o outro do pequeno-burgues
    o ideal é pequeno-burgues

    hauhauhauahauhauhauhauahuahauhua palavras irresponsaveis

    pode ter parecido (voto nulo)
    mas nada disso
    Voto na Dilma
    voto no partido
    embora o controle sobre alguns cargos importantes o tenha degenerado bastante
    como ser de outro jeito?

    e aproveito o espaço
    inescrupulosamente
    para fazer campanha para outro candidato do partido
    é o Roque 1328, candidato a Deputado Federal
    Ferroviário, a anos preside o sindicato... tem uma historia como militante dentro do partido - tanto que conquistou o mandato de vereador apos anos de uma campanha militante, sem recursos - e representa uma oposição consequente dentro do PT - diga-se de passagem o partido mais democratico (internamente democratico) que eu conheço.

    Assumo posições embora não goste de faze-lo

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  3. Não voto no Plínio, mesmo votando sistematicamente em candidatos do PSOL, de fato, por falta de uma "política dura" e real em seu discurso.

    Mas ainda que concorde contigo neste ponto, discordo em três outros. O primeiro é que Plínio seja "evangelizador". Mesmo que ele seja um católico fervoroso,na campanha ele não demonstrou, até onde a acompanhei, esta postura.

    Acho injusto, também, que nos distanciemos de argumentos e passemos,prontamente, a vincular argumentos à classe social daqueles que os proferem. Todos estes autores que você citou, por exemplo, eram burgueses. E se você é um daquele que "suja as mãos" você deve saber o quão convervador, muitas vezes, sãos os pobres deste país (o único eleitor do Maluf que conheço mora na favela do Heliópolis).

    Estou careca de conhecer o conservadordarismo que sai da boca da classe média leitora de Veja. Mas nem toda classe média lê a Veja e mantém esta espécie de discurso. E acho que este historiador colega seu, tentou formular um juízo autônomo, visando uma razão que não a razão instrumental e objetiva dos próprios interesses. Você pode, e deve, discordor, mas desqualificar o cara impondo uma pecha é um grande erro, você cala o debate e a possibilidade do sujeito entender seu argumento e , eventualmente, concordar contigo.

    Da minha parte, por exemplo, gostaria muito que a Dilma representasse o que você diz. Mas não vejo distribuição de renda efetiva no governo Lula. Como disse Chico de Oliveira, "estou para ver um país liberal que cresce economicamente e não gera emprego". E que empregos? Empregos que recebem não mais do que este salário mínimo miserável que temos (um dos menores da América Latina). Dá para negar que a distribuição de renda no Brasil é ainda, absurdamente, insuficiente?

    De qualquer forma, ficaria muito feliz que um eleitor da Dilma me demonstrasse o contrário, que o que o governo do PT é, de fato, efetivo quanto à ditribuição de renda.

    Enfim, eu acho que certa "impaciência" faz dos debates políticos, sobretudo entre amigos e pessoas que comungam dos mesmos fins políticos, menos produtivos e esclarecedores do que poderiam ser. Há, em boa parte doas discussões que ouço e leio, uma necessidade estranha de arrabatar e "vencer" ao outro que é vertiginosamente contrária à necessidade de ensinar e aprender (mas quem é lúcido o suficiente para recursar declarar-se o princípe da justiça e do saber?)

    Abraço.

    Tiago.

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