Olha! Sinto muito dizer isto, mas desta vez os hermanos nos venceram. Sem querer provocar uma guerra em nossas fronteiras do sul, tenho de advertir que eles ganharam a partida em matéria de cinema. Maradona nunca superou nossos craques, no entanto, é bem provável que Juan José Campanella consiga trazer para o seu país o Oscar de melhor filme estrangeiro que tanto cobiçamos.
Vi hoje O segredo dos seus olhos, depois de enfrentar uma fila imensa que promete se repetir na frente de muitos outros cinemas. Tá certo que é uma produçâo argentino-espanhola, realizada com dois milhôes de euros - quantia até pequena para os padrôes norte-americanos. Mas este fato nâo explica a beleza e o sucesso da película, pois Campanella já havia dirigido antes O filho da noiva, igualmente com grande sensibilidade e competência. Desta vez, realizou uma obra-prima. Estrelado por Ricardo Darin e Soledad Villamil (excelentes), o filme lembra o cinema noir, tem toques de humor, roteiro impecável, bela trilha sonora e outros atributos. Nâo vou contar a estória, digo apenas que foi adaptada do romance La pregunta de sus ojos, de Eduardo Sacheri.
Nâo pude deixar de compará-lo com o brasileiro Budapeste, recentemente transposto para a tela do livro homônimo de Chico Buarque. Confesso que até li umas cinco páginas desse romance, mas desisti diante de tanto hermetismo. Gosto das músicas do compositor, mas quanto à sua literatura, deixa prá lá! Assisti ao filme até o fim, rezando para que logo terminasse. Tinha fotografia e música boas, uma belíssima protagonista, afora isso, cenas arrastadas, tomadas panorâmicas despropositais, roteiro descosturado e assim por diante.
Por que a comparaçâo? Só pra dizer que o cinema psicológico nâo é o nosso forte. Alguém já viu filmes do Walter Hugo Khoury? Ou o Eu te amo (que só vale pela música de Chico)? Confiram e verâo que tenho razâo. Quando tentamos construir personagens com densidade psicológica, ou caímos na sexualizaçâo rasteira ou numa espécie de melodrama tipo Manoel Carlos.
Nâo quero aqui desprestigiar o cinema nacional, que já rendeu produtos magníficos. Fazemos bem chanchada (a antiga, e nâo coisas horripilantes tais como Carlota Joaquina, de Carla Camurati), road movies (Bye, bye, Brasil e Central do Brasil), cinema boca do lixo e de miséria social (Cidade de Deus), sem falar dos filmes de vanguarda euclides-glauberianos.
Nada de mal nisso. Antonio de Alcântara Machado disse, ainda nos anos vinte, que a literatura brasileira nâo criava personagens com profundidade psicológica. Oswald de Andrade afirmou, uma década depois, que o único escritor brasileiro capaz de falar da alma do indivíduo havia sido Machado de Assis, todos os demais só faziam retratos da paisagem nacional. Tendo a concordar com ambos. Dizem que Clarice é outra exceçâo, mas pouco li dela. Tem alguns novos escritores que tentam enveredar pelo caminho da subjetividade, os que conheço me parecem demasiado artificiais. É bem verdade que tivemos um Nelson Rodrigues no teatro, porém, é pelo grotesco e pela deformaçâo que fixou os tipos humanos. Trata-se de outra linha da nossa identidade cultural, embora de primeiríssima qualidade.
Dá no mesmo no caso do cinema brasileiro. Por isso, façamos bons filmes segundo nossa tradiçâo, que talvez seja explicada por algum componente antropológico próprio. Mas nâo nos aventuremos na criaçâo de personagens densos, como ultimamente se tentou, a exemplo do insuportável Budapeste. Isso é para outros, por enquanto, deixemos com os hermanos. E parabéns a eles.
Vi hoje O segredo dos seus olhos, depois de enfrentar uma fila imensa que promete se repetir na frente de muitos outros cinemas. Tá certo que é uma produçâo argentino-espanhola, realizada com dois milhôes de euros - quantia até pequena para os padrôes norte-americanos. Mas este fato nâo explica a beleza e o sucesso da película, pois Campanella já havia dirigido antes O filho da noiva, igualmente com grande sensibilidade e competência. Desta vez, realizou uma obra-prima. Estrelado por Ricardo Darin e Soledad Villamil (excelentes), o filme lembra o cinema noir, tem toques de humor, roteiro impecável, bela trilha sonora e outros atributos. Nâo vou contar a estória, digo apenas que foi adaptada do romance La pregunta de sus ojos, de Eduardo Sacheri.
Nâo pude deixar de compará-lo com o brasileiro Budapeste, recentemente transposto para a tela do livro homônimo de Chico Buarque. Confesso que até li umas cinco páginas desse romance, mas desisti diante de tanto hermetismo. Gosto das músicas do compositor, mas quanto à sua literatura, deixa prá lá! Assisti ao filme até o fim, rezando para que logo terminasse. Tinha fotografia e música boas, uma belíssima protagonista, afora isso, cenas arrastadas, tomadas panorâmicas despropositais, roteiro descosturado e assim por diante.
Por que a comparaçâo? Só pra dizer que o cinema psicológico nâo é o nosso forte. Alguém já viu filmes do Walter Hugo Khoury? Ou o Eu te amo (que só vale pela música de Chico)? Confiram e verâo que tenho razâo. Quando tentamos construir personagens com densidade psicológica, ou caímos na sexualizaçâo rasteira ou numa espécie de melodrama tipo Manoel Carlos.
Nâo quero aqui desprestigiar o cinema nacional, que já rendeu produtos magníficos. Fazemos bem chanchada (a antiga, e nâo coisas horripilantes tais como Carlota Joaquina, de Carla Camurati), road movies (Bye, bye, Brasil e Central do Brasil), cinema boca do lixo e de miséria social (Cidade de Deus), sem falar dos filmes de vanguarda euclides-glauberianos.
Nada de mal nisso. Antonio de Alcântara Machado disse, ainda nos anos vinte, que a literatura brasileira nâo criava personagens com profundidade psicológica. Oswald de Andrade afirmou, uma década depois, que o único escritor brasileiro capaz de falar da alma do indivíduo havia sido Machado de Assis, todos os demais só faziam retratos da paisagem nacional. Tendo a concordar com ambos. Dizem que Clarice é outra exceçâo, mas pouco li dela. Tem alguns novos escritores que tentam enveredar pelo caminho da subjetividade, os que conheço me parecem demasiado artificiais. É bem verdade que tivemos um Nelson Rodrigues no teatro, porém, é pelo grotesco e pela deformaçâo que fixou os tipos humanos. Trata-se de outra linha da nossa identidade cultural, embora de primeiríssima qualidade.
Dá no mesmo no caso do cinema brasileiro. Por isso, façamos bons filmes segundo nossa tradiçâo, que talvez seja explicada por algum componente antropológico próprio. Mas nâo nos aventuremos na criaçâo de personagens densos, como ultimamente se tentou, a exemplo do insuportável Budapeste. Isso é para outros, por enquanto, deixemos com os hermanos. E parabéns a eles.
Eu também assisti o Segredo dos Seus Olhos e fiquei estupefado: Roteiro bem amarrado, direção harmônica, bela fotografia e atuações brilhantes de Soledad Villamil, Ricardo Darín e, especialmente, de Guillermo Francella. Tem ainda aquela cena da perseguição no estádio de futebol que é acachapante e o final é um dos mais sensacionais que eu já vi. Não vi os outros filmes que concorrem ao melhor Oscar de filme estrangeiro, mas acho que a película de Campanella vai precisar de adversários muuuito fortes para perder a estatueta.
ResponderExcluirFiquei curiosa para ver o filme! Mas queria demovê-lo, quanta pretensão, da idéia de detestar Budapeste. Este livro do Chico foi o primeiro que consegui ler e gostar: insistir é preciso!
ResponderExcluir“(...) Com uma só palavra Kriska me cobriria de vergonha, me aleijaria, me faria andar torto de arrependimento pelo resto da vida. A palavra estava ali nos seus lábios vacilantes, devia ser uma palavra que ela nunca se atrevera a pronunciar. Devia ser uma palavra arcaica, derivada da voz de alguma ave noturna, uma palavra caída em desuso de tão atroz”