segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Pensamentos como gaivotas

Esta página precisa de ar, vôo e som para amenizar minha decepção. Ontem, três minutos depois que divulguei no twitter o post sobre o Zé Dirceu, perdi dois seguidores. Não lamento a diminuição do número de folowers, mas a vilania do preconceito e o embrutecimento mental. Isso me amedronta. Fujo então para os ares, fora do mundo da política, nem que por pouco tempo.
Que seja a emoção da música a fuga de hoje. Vivo uma fase fadista desde que vi o belíssimo filme de Carlos Saura. Corri então ao inevitável shopping para procurar cds da Amália. Achei o disco dela em parceria com Vinícius, o nosso poeta, gravado em Lisboa a 19 de dezembro de 1968, quando as sombras do Salazar enfermo anoiteciam Portugal e os óculos escuros dos generais aterrorizavam o Brasil. Ainda assim, Amália e Vinicius cantavam num sarau iluminado.
Ouço-os agora sem parar, mas que pena não poder ou não saber inundar este blog com o seu som. Assim como para esta página, muitas vezes imaginei aulas e ciências sensibilizadas pela música, pelo drama, pela imagem lenta ou clípica, pelo sono surreal e pela meditação. Ambientes experimentais de leitura, debate e todo tipo de expressão da alma. Práticas de descoberta do corpo, da mente e do espírito, do conhecimento, da ciência e da arte. Outro ensino.
Já não se pode, professor, já passou o tempo.
Como já passou este blog, também impossibilitado de alçar vôo. Nem o vídeo que pretendia emocionar esta tela pude baixar, pois não está livre.
Que fique somente uma casca do possível: uma letra, umas imagens de um sentimento, de uma fuga, de uma decepção, de um vôo interceptado.


 Gaivota



Música: Alain Oulman
Letra: Alexandre O'Neill




Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.


Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.


Se um português marinheiro,
dos sete mares andarilho,
fosse quem sabe o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.


Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu,
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.


Que perfeito coração
no meu peito morreria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.








Um comentário:

  1. "Eu sempre sonho que uma coisa gera,
    nunca nada está morto.
    O que não parece vivo, aduba.
    O que parece estático, espera."
    Adélia Prado

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