segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Mais música para lavar a alma

Para lavar a alma nada melhor do que uma canção italiana. Tive conhecimento deste compositor e intérprete em Roma, onde me alojei, na última semana de viagem, num colégio brasiliano de formação de padres. Ao indagá-los sobre o que rolava de boa música por lá eles me indicaram esta canção de Renato Zero, cantor quase desconhecido entre nós. Fui logo comprar um CD.
Zero é uma figura pop que lembra os nossos Renato Russo e Roberto Carlos, numa mistura inusitada. A voz e o estilo se parecem com o do primeiro, assim como certa tendência protestante em algumas das suas letras - palavra aqui empregada no sentido exato de quem protesta difusamente contra o mundo, e não na acepção religiosa. A semelhança com o segundo está no romantismo algo excessivo, que beira a breguice. A juventude italiana gosta muito dele, certamente não o público empinadamente cult.
Muito da música italiana tem, aliás, um quê de canastrice, de grandiloquencia, de exacerbação dos sentimentos. Eu gosto disso nos momentos preliminares de limpeza do corpo e do espírito, antes da meditação profunda. Tem o efeito de um sabão áspero para a limpeza grossa. Peço desculpas aos cults de plantão. Espero que os demais gostem.


domingo, 29 de novembro de 2009

Aos comentadores e seguidores, amigos e amigas

Como é difícil comentar os comentários, um por um, rebater ou apoiar opiniões, deixo aqui uma forma de dizer o quanto vcs têm sido importantes para a continuidade deste blog. Hoje, um abraço especial a Francisco Almeida, que não conheço pessoalmente, mas que me fez pensar. Valeu. Espero que gostem deste outro fado. Será o último da fase fadista, prometo.

Ainda sobre fantasias de estupro

Agora estou mais aliviado. Embora tenha condenado veementemente as insinuações infames do PIG, levei umas lambadas por supor, como exercício imaginativo, alguma piada sexual de Lula sobre o seu período na prisão envolvendo o tal do "menino do MEP" (ver post anterior). Disseram que com isso eu justificava a atitude do Cesar Benjamim e da Folha de São Paulo.
Pior foi a culpa interna que senti. Como se, para dizer que a suposta confidência de Lula se tratara de simples chiste, típico da cultura dos peões, e do machismo característico da época (também dos militantes da esquerda), tivesse maculado a imagem do presidente. Ora, por que Lula não poderia ter fantasias, se o animal humano vive delas? Se, como disse Freud, são elas formas de desrequalque diante das repressões do inconsciente? Nada mais do que isso? E que a própria denúncia de Benjamim revelaria, nas entrelinhas, a fantasia de ser estuprado pelo poder de Lula? Por que as pessoas têm de ser puras e transparentes? Ao preço de esconderem sob o tapete suas vilanias, como quer o PIG?
A maioria das reações contrárias ao artigo da Folha resumiu-se a negar, sem analisar seus meandros sutis, a suposta confidência de Lula num momento de descontração, como muitos outros em que ele sempre se solta, fala bobagens, como todo brasileiro. Defendê-lo, para muitos, significava apenas imaculá-lo.
Fiquei culpado. Até que li, ontem, a confirmação da piada de Lula num depoimento de Silvio Tendler, cineasta também presente na cena original. Simplesmente uma piada frequente numa época em que não havia o fascismo politicamente correto e em que a PIG usava outras denúncias para suas tentativas de golpe.
Não errei na minha interpretação. Tanto que penso até mesmo em pedir autorização do meu analista para me estabelecer com um divã em uma sala qualquer e começar a clinicar. Meu primeiro paciente poderá ser Cesar Benjamim. Lula não precisaria disso, pois já aprendeu muito de tanto levar porrada.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

De estupros e fantasias

O PIG (Partido da Imprensa Golpista), sigla já bastante conhecida na NET, não cansa de surpreender. Herdeiro direto da velha UDN, usa e abusa de todos os meios para achincalhar o governo, humilhá-lo, jogá-lo na lama. Excedeu todos os limites do aceitável, em matéria publicada hoje na repugnante Folha de São Paulo, cujo teor seria capaz de escandalizar até Carlos Lacerda, o corvo.
Antigamente, como leio na biografia de Castello Branco - escrita por Lira Neto -, os golpistas recorriam ao discurso anticomunista, típico da Guerra Fria. Apelam agora a um arremedo infame do moralismo politicamente correto, que se presta bem ao sensacionalismo marrom. O ventríloquo dos golpistas é, mais uma vez, César Benjamim, obscuro e desequilibrado ex-militante de esquerda, justamente esquecido atualmente. Diz ele em seu artigo divulgado na folha repugnante que Lula lhe confindenciou, em 1994, haver tentado estuprar, durante seu período de prisão, um companheiro de cárcere, integrante do MEP (Movimento de Emancipação do Proletariado.
A rigor, não vale a pena gastar espaço virtual com tal matéria barata, mas não posso deixar de expor minha indignação. Supondo que seja verdade, os envolvidos eram dois homens maiores de 18 anos, capazes de dispor das próprias vontades e de defendê-las. Conheci, à época, vários militantes do MEP, então nossos adversários políticos ou eventualmente nossos aliados, e não me lembro de haver entre eles nenhum sexualmente ingênuo ou submissso a qualquer tipo de violência. Mas prefiro ir por outro caminho: supondo que a confidência tenha ocorrido, deve ser debitada à língua solta de Lula (apesar de anatomicamente presa, e talvez por isso mesmo), sempre responsável pela veiculação de algumas bobagens entre muitas falas respeitáveis.
Estaríamos, assim, em pleno território da fantasia. Do machismo ao qual Lula não estava imune naquela época em que gay era viado e que o macho comedor não se via como homossexual. Lula talvez pensasse assim, era próprio da sua cultura migrante - e até da cultura militante e da cultura em geral-, o que não quer dizer que comeu de fato ou que estuprou o rapaz, já que este teria resistido. De lá para cá, certamente Lula aprendeu a ser mais contido e a usar politicamente sua espontaneidade, o que o tornou uma figura de grande popularidade e respeitabilidade.
Estou acostumado a ouvir (e tb a falar) coisas politicamente incorretas em mesas intelectuais quando já descontraídas depois dos rituais acadêmicos. Rimos de piadas de português, de judeus, de gays, sapatões, loiras e negros, às vezes contadas por acadêmicos  representativos desses mesmos segmentos.  Trata-se de auto-ironia e desrecalque, velhos expedientes conhecidos pelos mais primários freudianos.
Que mal isso faz, a não ser quando se torna objeto de manipulação pela ideologia nazista do politicamente correto ? Philipp Roth tratou brilhantemente desse mal no livro A marca humana, mas não acho que é exatamente disso que se trata entre nós. Aqui a coisa é mais rasteira: trata-se de mera instrumentalização de uma suposição fantasiosa pelo PIG, o partido da moralidade hipócrita, que usa dois pesos e duas medidas para tentar seus golpes, às vésperas da grande guerra que será 2010. Denuncia o mensalão dos outros e omite o próprio, oculta o filho bastardo de FHC, joga para debaixo do tapete o pó, que dizem, de vez em quando entra pelas narinas do belo e educado Aécio.
A verdade é que para a grande política não deveriam interessar as fantasias involuntariamente reveladas nas piadas ou nos chistes, nem as pulsões da nossa vida íntima, desde que saibamos nos responsabilizar por elas e não venhamos a comprometer a ordem social legítima. Imagem se o papa Bento XVI já não se masturbou pensando em alguma mulher ou homem? Que Serra não tem orgasmo com alguma imagem, sabe-se lá de que? Que a madre Teresa de Calcutá nunca sonhou com alguma forma de sexo?
O que importa, isto sim, são as realizações dos governantes e dos representantes do povo: destinam-se ao bem-estar coletivo ou aos interesses de grupo; são justas, promovem a solidariedade, o desenvolvimento e a igualdade social?  Estas devem ser as perguntas para julgar Lula.
Todo o resto pertence à esfera das fantasias que todos nós carregamos. Até mesmo às de César Benjamim, que empalado pela esquerda, de vez em quando volta a gozar com sua fantasia secreta concentrada no falo de Lula.  

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Matriarcas executivas




Quando planejo uma reflexão meditativa mais longa, logo recebo novas tarefas das minhas amigas de trabalho. Tarefas sempre inesperadas, o mais das vezes sem remuneração, a não ser simbólica, de um simbolismo tendente a se desvalorizar pelo excesso de gratificação desse tipo no mercado atual.
Convidam-me (não é bem o termo) para bancas, pareceres, projetos ou relatórios, reuniões científicas e assim por diante. Aceito, afinal, por educação, coleguismo e, principalmente, por complexo de culpa. Como se visse o rosto da minha mãe (será do meu pai?) a me repreender e acusar!
Com o risco de cometer um sacrilégio, digo aqui que já retornamos ao matriarcado. Não ao primitivo, como sonhava Oswald, mas o moderno. As novas matriarcas estão ai, tudo a controlar. Contenham-se, porém, amigas! Não é preciso organizar nenhuma passeata. Refiro-me ao mundo acadêmico e, talvez, a algumas outras organizações empresariais congêneres, nas quais as executivas já chegaram ao topo.
Obviamente, não falo das mulheres das classes D e E, que além de receberem salários inferiores aos dos homens, ainda não alcançaram os postos de mando, afora o do lar, sobretuedo quando se libertam dos seus maridos machistas.
O universo acadêmico (melhor seria dizer microverso) e as organizações empresariais propriamente ditas, ressalto, são o laboratório para o teste das múltiplas habilidades femininas. Elas são vistas para lá e para cá, sempre extenuadas e sem tempo, mas sempre com a mesma eficiência na coordenação das mais diversas tarefas. No caso universitário, pululam entre congressos aqui e alhures, revezam-se na apresentação de mil papers, opinam, avaliam, organizam, captam recursos, diretrizam... E nesse cenário pressinto que o homem está encostando o corpo, com tranquilidade e segurança.
Não sei porque, mas acabei de me lembrar dos filmes de Almodovar. Sei que vão dizer que é daquele sobre as mulheres à beira de um ataque de nervos! Pode ser, mas a paisagem que descrevo se parece mais com a de outras películas. Na verdade, o que me veio à mente foi aquela personagem do filme Kika, com uma câmera na cabeça em busca de imagens para seu programa de tv "O pior do dia". Também as freiras drogradas e sádicas de Má educação, que se dedicavam a salvar mulheres decaídas e a alimentar um tigre em seu quintal. Lembrei-me ainda que nos seus filmes os homens cumprem papéis subalternos, e às vezes mal fazem parte dos enredos.
Assim também é em nosso microcosmo. Com isso não prego aqui nenhuma sublevação contra o matriarcado executivo daquelas que são, antes de tudo, minhas amigas. Até porque elas nunca leram e nunca lerão este blog, pois não perdem tempo com bobagens.
Nem julguem que ao expressar estas idéias manifesto algum ressentimento masculino. Simplesmente por uma impressão: o capitalismo, da qual elas se tornaram executivas, ainda não é feminino. Poderá ser um dia - aproveito para dizer que também votarei em Dilma, pelas mesmas razões da eficiência gerencial. Mas também não é andrógino ou assexuado. Por enquanto, continua masculino, o que digo sem qualquer júbilo e na esperança de ser perdoado pela blasfêmia.

 



terça-feira, 24 de novembro de 2009

Um pouco de som






Finalmente, aprendi baixar vídeo pra vocês. Deixo estes dois primeiros: Gaivota, na versão clássica de Amália Rodrigues, e em versão atualizada.

domingo, 22 de novembro de 2009

Fado para a lua de Lisboa (David Mourão Ferreira)

Ó lua, espelho do chão
que andas no céu pendurado,
holofote da ilusão
pelo turismo alugado,
não ilumines em vão
os sulcos do empedrado!

Denuncia nas valetas
As sombras que tu arrastas:
prostitutas, proxenetas,
silhuetas de pederastas...
colos brancos. Rendas pretas.
Casas tortas. Pedras gastas.

As rugas do sobressalto,
Ó lua não as destruas!
Tu viste carros no asfalto
rondarem por estas ruas;
viste rolarem no asfalto
vestes mais alvas que as tuas.

Foste a lua que se expunha
aos tiros a multidão;
espelhastes na tua unha
a secular aflição;
e já foste testemunha
dos fogos da Inquisição.

Procissões do Santo Ofício...
fileiras de condenados...
À noite, nem só o vício
rasteja por estes lados:
as serpentes do suplício
silvam nos pátios murados...

Ó lua, guarda o retrato
de tudo, tudo a que assistas!
Não queiras passar ao lado
da desgraça que visitas!
Nem queiras ser infamado
Passatempo de turistas!

Clorofórmio dos enfermos,
se foge dos hospitais,
então recolhe-te aos ermos
desertos celestiais!
E enquanto te não merecemos
Não te acendas nunca mais!

Poema declamado pelo autor em dezembro de 1968, no sarau em casa de Amália Rodrigues, que reuniu fadistas e poetas, entre eles Vinícius de Morais.
(Para meu amigo Anderson, eterno militante das causas vividas no supermundo)

sábado, 21 de novembro de 2009

By the way: a feiúra de Castello e o golpe de 64



Gosto de biografias. Nestes dias leio duas, ao mesmo tempo. Quando o assunto de uma está interessante, logo passo a outra com a idéia de retornar após o suspense. Uma é sobre a vida do marechal Humberto de Alencar Castello Branco, escolhido pelos golpistas como primeiro presidente do regime militar. A outra trata dos últimos anos de Freud em paralelo à ascensão de Hitler ao poder.
As biografias estão na moda - na verdade nunca saíram. O que há de novo é que os historiadores estão seriamente empenhados em retomar este gênero que foi muito cultivado pelos clionistas tradicionais. Uma pena, pois logo teremos livros do tipo vendidos a rodo por RS 1,99. Neles não faltarão, é claro, longas incursões teóricas e metodológicas sobre a ilusão biográfica - a la Bourdieu -, as armadilhas da memória e as escritas de si. Mil congressos e simpósios serão (já são) realizados para debater tais chatíssimas obviedades.
O fato é que para escrever biografia são necessárias poucas coisas: talento, sensibilidade, erudição e faro investigativo, justamente o que muitas vezes falta na academia. E o que sobra no livro do jornalista Lira Neto (Castello: a marcha para a ditadura), que além das outras qualidades citadas, demonstra grande sensibilidade para compreender a alma humana e o seu papel no curso dos acontecimentos históricos.
Uma das chaves dessa construção biográfica é a feíura de Castello, handicap introjetado desde a infância que o marechal converteu em pulsão de poder. Seu sucesso na carreira militar foi o resultado de um esforço hercúleo para provar que era superior aos que o chamavam de  macaco, sem-pescoço ou quasímodo, numa época em que ainda não se conhecia o bulling. Embora Lira Neto não reduza a vida do marechal a esse estigma, já que também dá grande relevo à sua condição de nordestino da baixa classe média, filho e neto de outros militares -, não deixa de reconhecer a importância crucial dos aspectos psicológicos na história, sem incorrer em psicologismo barato.
Por que trago à baila este assunto se não pretendo resenhar as obras mencionadas? Ainda que isto possa decepcionar, respondo que é só para retomar o tema do post anterior. Muitos historiadores - entre os quais me incluo - nunca estiveram satisfeitos com a história desencarnada. Mas nem sempre as respostas a tal frustração tem sido satisfatórias. Sem falar da safra de baixa qualidade da historiografia atual - subjetivista, pueril e romântica -, houve gente boa que tentou, sem sucesso, dar humanidade aos processos históricos, dedicando-se, por exemplo, às mentalidades ou psicologia coletiva. Alguns chegaram até mesmo a sondar possíveis relações entre história e a psicanálise.
Nada disso deu certo. O próprio Freud, como se narra na segunda biografia (não é bem o termo para o livro), esteve obcecado por entender o papel do inconsciente na vida coletiva, basta ler suas obras sobre Moisés e o monoteísmo, O mal-estar da civilizaçãoO futuro de uma ilusão. Foi quem chegou mais próximo da compreensão dos estranhos motivos que subjazem na vida social, cultural e política.
A maioria de nós, mortais, porém, não consegue alcançar essa dimensão obscura. Para atenuar nosso descontentamento é que servem as biografias. O problema é que existem poucos personagens dignos de serem biografados. Lira Neto escreveu um bom livro, ainda que Castello seja um defunto que não mereça suas velas.
Entre a história e a vida, tanto a que late quanto a latente, há uma abismo intransponível. Sou historiador, gosto de livros de história, mas prefiro as biografias.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

O desassossego - em memória de Fernando Pessoa.

Tem uns cinco anos que a psicanálise serve para aplacar e reacender meu desassossego. Livros dessa marca já somam quase o mesmo número das obras de literatura, filosofia ou história na minha biblioteca.  Além de não caberem nas estantes, também se acumulam na fila de leituras. O último que comprei trata dos anos finais de Freud a partir da sua fuga para a Inglaterra. O autor, cujo nome não me recordo nesta lan house, é pouco conhecido por aqui - um professor universitário britânico, do tipo especializado.
Décadas atrás, procurava o sentido da vida e do mundo em outras plagas e pragas. Toda gente vive em busca desse sentido. Muitos se contentam com coisas mais tangíveis, um casamento, um trabalho, uma fortuna, um time, uma injeção de botox. Para mim e para os outros inconformistas, no entanto,  nada disso compensa. A solução é então viver na constante intranquilidade.
As religiões não me satisfazem, exceto no seu aspecto ritualístico. Gosto, por exemplo, do cheiro de incenso católico e ortodoxo, que embora não conduza a uma verdade suprema, é capaz de produzir um ecstasy agradável. Aprecio também as cerimônias de origem africana, sempre inebriantes e estimuladoras das manifestações instintivas. Mas detesto os espetáculos neopentacostais e carismáticos. Se para conversar com deus é preciso urrar grotescamente, prefiro falar comigo mesmo em silêncio. O budismo talvez fosse saudável para mim se o tivesse cultivado desde a infância. Na altura em que estou, não tenho mais paciência para levitações e meditações prolongadas.
É claro que sempre haverá um romance com o qual eu possa me identificar. Ultimamente, são poucos e raras vezes inspiradores. A História nunca foi minha fonte preferida, sobretudo agora, que se tornou uma espécie de metodologia aplicável a qualquer situação, até a mais insignificante. Descobri que gosto da História como exemplo de atos de grandeza, à maneira dos antigos, o que, obviamente, não se encontra com tanta facilidade nos tempos.
Gostaria de ter gostado das grandes especulações da Física, mas não tenho conexões neuronais suficientes para isso. Felizmente, meu filho realiza essa vontade por mim, ele que ama a física teórica. Acho as outras ciências chatas e inferiores, principalmente as ditas sociais, cuja pretensão me faz gargalhar. Quanto às técnicas - que segundo creio, abrangem todo os demais saberes -, não são capazes de me despertar qualquer curiosidade.
Me sinto também muito atraído pela Filosofia, contudo, dificilmente consigo acompanhar seus discursos. Tiro dela aquilo que é mais simples de entender e que faz algum sentido na busca de sentidos. Durante anos fiquei vidrado no existencialismo, com o qual iniciei contato por meio dos romances sartreanos e só depois alcancei no discurso filosófico. Ainda penso no indivíduo como alguém a sós com sua liberdade contingente.
Mas, como dizia no início deste post, nos últimos anos só encontro algum alívio nos livros de psicanálise. Não nos de psicologia do ego, que se disseminam barbaramente com receitas de melhora da autoestima, receitas retwitadas ao infinito pelas socialites e evangélicas da televisão. 
Falo da psicanálise em sentido estrito, exatamente aquela que se constituiu na frição entre a filosofia e a ciência, e não se reduz a um método nem a uma técnica. Aquela que deslocou o homem de todos os outros sentidos e o revelou também a sós - não com sua liberdade, como no existencialismo, mas com seu desejo - esse profundo desconhecido, também chamado de isso ou aquilo que nos escapa entre os dedos, deixando apenas o desassossego repetido.  

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Pensamentos como gaivotas

Esta página precisa de ar, vôo e som para amenizar minha decepção. Ontem, três minutos depois que divulguei no twitter o post sobre o Zé Dirceu, perdi dois seguidores. Não lamento a diminuição do número de folowers, mas a vilania do preconceito e o embrutecimento mental. Isso me amedronta. Fujo então para os ares, fora do mundo da política, nem que por pouco tempo.
Que seja a emoção da música a fuga de hoje. Vivo uma fase fadista desde que vi o belíssimo filme de Carlos Saura. Corri então ao inevitável shopping para procurar cds da Amália. Achei o disco dela em parceria com Vinícius, o nosso poeta, gravado em Lisboa a 19 de dezembro de 1968, quando as sombras do Salazar enfermo anoiteciam Portugal e os óculos escuros dos generais aterrorizavam o Brasil. Ainda assim, Amália e Vinicius cantavam num sarau iluminado.
Ouço-os agora sem parar, mas que pena não poder ou não saber inundar este blog com o seu som. Assim como para esta página, muitas vezes imaginei aulas e ciências sensibilizadas pela música, pelo drama, pela imagem lenta ou clípica, pelo sono surreal e pela meditação. Ambientes experimentais de leitura, debate e todo tipo de expressão da alma. Práticas de descoberta do corpo, da mente e do espírito, do conhecimento, da ciência e da arte. Outro ensino.
Já não se pode, professor, já passou o tempo.
Como já passou este blog, também impossibilitado de alçar vôo. Nem o vídeo que pretendia emocionar esta tela pude baixar, pois não está livre.
Que fique somente uma casca do possível: uma letra, umas imagens de um sentimento, de uma fuga, de uma decepção, de um vôo interceptado.


 Gaivota



Música: Alain Oulman
Letra: Alexandre O'Neill




Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.


Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.


Se um português marinheiro,
dos sete mares andarilho,
fosse quem sabe o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.


Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu,
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.


Que perfeito coração
no meu peito morreria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.








sábado, 14 de novembro de 2009

Zé Dirceu, o brilhante estrategista do PT





Escrevo com pressa e antes que minha autocensura funcione. Autocensura em termos: na verdade censura social, cultural, institucional introjetada. Imagino o que diriam beltrano e sicrana, com endereços, rgs e vínculos profissionais identificados e que logicamente nem cogitam entrar neste blog, se lessem estas linhas.
Vou falar, sim, de Zé Dirceu, que acabo de ver e ouvir aqui em Rio Preto, na comemoração dos 30 anos do PT, partido em que até agora sempre votei, mas do qual não sou membro. Vou falar, sim, sem me preocupar com o tom emocional e que se danem os que dizem que sou emocional. E vou falar, sim, sem me preocupar com as possíveis contradições da minha fala em relação ao saber acadêmico supostamente crítico.
Zé Dirceu foi e continua a ser o grande estrategista do projeto que o PT leva à frente. E exatamente por isso foi cassado, por nenhuma outra razão. Não adianta virem com outros motivos, seja de moralidade torpe ou de hipocrisia política. Mas nem essa injustiça mais flagrante foi capaz de fazê-lo baixar a crista. Zé Dirceu é da linhagem daqueles revolucionários dos velhos tempos: matreiro, cínico, lúcido, maquiavélico, inteligente, rochoso sem perder a maleabilidade da utopia socialista.
Zé Dirceu deu alicerce ao PT, controlou o PT mas sabia porque e para quê. Tinha estratégia. Foi acusado de bandido, criminoso, ladrão, amoral, enfim, tudo aquilo que poderia derrubar um fraco, não um homem que sabe o que se oculta sob tais epítetos numa guerra política. Sim, porque entre nós vivíamos (espero que o verbo esteja no tempo certo) uma guerra entre a direita secularmente empedernida e uma esquerda recentemente no poder, com suas fraquezas e virtudes. Como diz Lula, o que esteve em jogo na época do suposto mensalão foi uma clara tentativa de golpe para derrubar um presidente que atualizava o projeto interrompido em 1964.
Quem tiver a coragem de ouví-lo, de ler o seu blog e de se desarmar um pouco das autocensuras, saberá quais são suas idéias. Zé Dirceu não é um autor de livros, suas propostas estão ai, na prática política diária. Tem visão a longo prazo a respeito da questão tecnológica brasileira, dos nossos desafios energéticos, educacionais, sociais etc. Não é um obtuso, ao contrário, repensa o socialismo nos termos nacionais, continentais e globais, mas um socialismo conectado no mundo das conexões instantâneas. Preparou-se para isso no movimento estudantil, na clandestinidade, em Cuba, no parlamento e no partido. É respeitado dentro e fora do Brasil por empresários e governos. Tirou lições dos sucessos e derrotas.
Haverá o momento em que será feita justiça a Zé Dirceu. Não falta muito.



O que pode estar em jogo na indicação do novo reitor da USP

Interrompo a linha dos posts anteriores para uma breve nota enragé a respeito da nomeação do segundo colocado na eleição para reitor da USP. Não vou chover no molhado sobre o grave precedente que o ato significa. Todos sabem muito bem. E principalmente o governador Serra sabe muito bem o que está fazendo. Não se trata de mera birra ou truculência política.
Trata-se da tentativa de implantação de um projeto que é claramente defendido por setores do PSDB: castrar a autonomia das universidades públicas e instituir progressivamente o ensino pago para determinados segmentos sociais. Tal projeto se casa perfeitamente com as políticas de desvalorização do ensino público em escala ampla desde o ciclo fundamental. Integra-se perfeitamente ao pensamento neoliberal, que apesar de ter feito água mundo afora, continua a ser a menina dos olhos dos ideólogos de um partido que se tornou o principal aglutinador da direita brasileira.
Serra tentou castrar a autonomia universitária já em sua posse, o que provocou um movimento de amplas proporções diante do qual teve de recuar. Os alunos estiveram à frente da mobilização vitoriosa - os mesmos alunos que pouco papel exercem na eleição interna da USP. Resta saber se agora serão novamente instados a defender a autonomia universitária e, simultaneamente, um sistema eleitoral que os alijou do processo decisório.
De qualquer modo, o ato de Serra não afetará apenas a USP. Mais cedo ou mais tarde, igualmente a UNESP e a UNICAMP e, se o PSDB retomar a presidência da república, o ensino superior brasileiro em geral, que nunca viveu um momento tão virtuoso como hoje.
Não devemos nos omitir nesse quadro. Convido-o(a)s ao debate e deixo aqui dois links sobre o assunto:



sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Um balanço do blog

Venho matutando sobre algumas mudanças no blog, mas não sei ainda como fazê-las. Nestes três meses cada vez gosto mais de escrever aqui. É um aprendizado, uma iniciação de alguma coisa que não sei aonde vai dar, e nem sei se deve ter um destino.
Gostaria de criar boxes diferentes. Um para o texto principal, que no meu caso, é uma mistura de artigo e crônica (pelo menos penso assim), cujo tamanho é obviamente maior e a periodicidade mais lenta; e outros para comentários breves sobre livros, filmes, política em tempo real, cotidiano etc. Gostaria também de responder aos comentários, replicar, concordar, debater, o que no modelo atual só posso ocupando espaço de outros comentadores. A interatividade fica prejudicada. Sem falar das idéias que me surgem subitamente no trânsito, no trabalho, no sono e em outros lugares que não devo mencionar nesta página. Perco-as na maioria e então me sinto como um escorredor de macarrão: engordurado mas vazio.
Ocorre que o formato do blog - adquirido gratuitamente - é muito engessado e seco. Além disso, sou péssimo em tecnologia, o que me impede até de explorar melhor o que ele tem de bom. Por exemplo, não sei incluir as indicações de outros blogs o que pode parecer soberba. Nem mesmo sei criar tópicos distintos para posts, imagens e links.
Sou de outro planeta geracional. O que sei bem é datilografar. Até tirei diploma de datilógrafo. Aliás, quero encontrá-lo na casa da minha mãe para colocar na parede junto com os de doutor e livre docente. Para mim ele tem um valor muito maior.
Voltando à vaca fria, penso em migrar o blog para um site, mesmo que tenha que pagar um administrador. Dizem que custa pouco. Vale mais um prazer do que o pouco dinheiro no bolso.
Por isso, amigos e amigas, se tiverem sugestões peço que deixem aqui ou enviem por e-mail. Gente que poderia fazer a página, onde situá-la, enfim, o que for necessário para que depois eu possa apenas datilografar direitinho meus textos. Sou bom nisso, como aprendi na escolinha, de forma bem caprichada.

domingo, 8 de novembro de 2009

O eterno fado de caetano x chico

Não fiquei sossegado desde o último post. O fato é que, depois de sair do cinema, corri na chuva pela avenida Paulista à procura da primeira lan house aberta. Procurava a tela brilhante da net por dois motivos, que talvez se resumam a um único.
Primeiro, para dizer aos amigos e amigas que acabei de ver Fados, o filme-documentário de Carlos Saura (o mesmo de Cria Cuervos, realizado ainda durante a ditadura franquista) em exibição na Mostra Internacional de Cinema. Magnífico, emocionante, daqueles aplaudidos pelo público ao final da sessão. Estão lá os mais importantes fadistas portugueses vivos, os jovens e os velhos, mas também os já mortos, justamente homenageados. Estão lá ainda os fados modernos, os fados de Moçambique e outras ex-colônias, nas maravilhosas vozes de intérpretes que desconhecemos, estão lá modinhas e lundus brasileiros. Estão lá músicos de primeira, cantores e cantoras de vozes lindas, ritmos e entonações que nos fazem desabar na poltrona. Estão lá, e não poderiam deixar de estar num filme de diretor espanhol, dançarinos que sangram música em seus corpos, trágicos e sublimes.
Segundo, para falar com orgulho, que entre os cantores e dançarinos do documentário, também estão três brasileiros enlevados na mesma paixão: Toni Garrido, que interpreta com ternura e alma uma modinha brasileira, contracenando com belíssimas mulatas a deslizar como anjos pelo salão; Chico Buarque e seu Fado tropical, numa apoteose celebrativa da Revolução dos Cravos que, junto com Grândola, vila morena, faz a platéia chorar; e Caetano Veloso a entoar - quase sussurrar -, com emoção e virtuose, a Estranha forma de vida, canção de Alfredo Duarte e Amália Rodrigues.
A presença desses dois brasileiros de uma mesma geração, ambos engajados até o pescoço na vida política e cultural brasileira dos anos 60 e 70, cada um com suas idiosincracias, me fez lembrar da velha rivalidade entre seus fãs. Eu, que sempre gostei dos dois, presto a eles aqui minha homenagem, porque bem sei que um artista não se julga apenas pelo que diz, mas sobretudo pela sua arte. Segue um trecho da canção interpretada por Veloso:

"coração independente
coração que eu não comando:
vive perdido entre a gente
teimosamente sangrando
coração independente.

eu não te acompanho mais:
para, deixa de bater
se não sabes aonde vais
por que teimas em correr
eu não te acompanho mais".

E assim deixo aqui uma palavra e um apelo a Caetano, caso ele pudesse ler esta página. Sei que o coração humano vive sempre uma vida à parte, especialmente no corpo do artista - o mais frágil de todos os seres. Mas sei também, Caetano, que é a tua língua que não te acompanha mais, e menos o teu coração. Não a tua língua poética, essa que ainda deve guardar alguma poesia, e sim a tua língua política, reacionária, que se não te compromete como artista, te degrada como homem. Vai, deixa de falar!

Glórias e baixezas humanas: de Lévi-Strauss a Caetano, passando por FHC em ordem decrescente

A semana que finda deixou bons exemplos para se pensar sobre o caráter dos homens e o significado das suas obras.
Começou com a morte de Lévi-Strauss, um dos últimos intelectuais do século XX que ainda procuravam a humanidade do homem, a despeito do seu método antropológico estrutural ter sido classificado, por uma certa crítica, de anti-humanista. Viveu mais de cem anos fiel à cultura primitiva e à natureza, ainda que fechado em seu gabinete parisiense. Não se degradou nem cedeu às modas globais da estação. Nos anos trinta, época em que conheceu os tristes trópicos, já lastimava a crescente transformação das mil e uma culturas remanescentes dos primórdios da humanidade em monocultura.
Terminou com a passagem (para onde?) de Anselmo Duarte, apenas um ator e sem a dimensão intelectual do primeiro, mas que se tornou conhecido no mundo inteiro por representar o protótipo do brasileiro rude e pobre, eterno pagador de promessas ao deus punitivo, no filme vitorioso em Cannes, na mesma França do antropólogo.
Lévi-Strauss tentou compreender a cultura pela interpretação dos mitos primitivos encontrados na América do Sul, pois todo mito encerra a grandeza da inteligência humana. Os gregos antigos do seu continente de origem também cultuavam mitos e acreditavam que a história humana, situada abaixo dos deuses, cumpria ciclos que iam da grandeza à decadência. Os homens, meros seres mortais, se pretendessem se espelhar nos deuses, deveriam ao menos realizar grandes obras.
Mas não são todos os que se medem por tais valores. Duas outras manchetes da semana trouxeram à baila personagens que dia-a-dia vão perdendo a grandeza.
FHC, que não chegou a ser aluno do mestre francês nem legará obra como a dele, mas sempre se mirou no modelo da cultura européia, destilou novamente a arrogância do intelectual colonizado. Assombrado desde sempre com o fantasma do populismo varguista ou lulista - uma criação conceitual da inteligência uspiana -, se perfila como o último ideólogo do fracassado neoliberalismo.
Caetano Veloso, que compôs uma bonita canção alusiva a passagem de Lévi-Strauss pela baia da Guanabara, também deu mostras da progressiva degradação depois de ter composto um obra grandiosa, hoje estagnada. É verdade que ele esteve sempre à direita - é só lembrar dos seus votos anteriores em FHC e nos contatos estreitos da sua família com ACM. Caetano ainda se imagina no palco dos velhos festivais em luta com obtusos e festivos nacionalistas de esquerda. Seu companheiro dos tempos do tropicalismo, Gilberto Gil, ao contrário, tem dado contribuições políticas muito mais importantes do que discursos oportunistas em época pré-eleitoral. Assim como FHC, Caetano tem medo do estado forte, dos populistas que não sejam astros pop e do poder dos analfabetos. Para ele, os lulas, os índios descidos como super-homens e os pagadores de promessa são apenas matéria de contemplação e criação estética,
Começo a pensar que era verdadeiro o antigo mito de uma idade do ouro, à qual se seguiriam eras e homens cada vez mais decadentes. 



quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Elogio da autodidaxia

Sempre tive comigo que a melhor maneira de aprender é por conta própria. Por óbvio, isto não pressupõe o isolamento, mas a troca do saber com aqueles que escolhemos e que nos escolhem de modo livre e espontâneo. Desde a adolescência segui inconscientemente esse caminho do qual absolutamente não me arrependo. Do ginásio à universidade aproveitei da escola, quando havia, aquilo que ela podia me dar de melhor - o ambiente, as amizades, a partilha cultural e política não-institucional.
Cumpri tabela na maior parte das disciplinas. Estudava com prazer o que me interessava e levava nas coxas, ainda que com certo êxito, as demais matérias. Não enganei nenhum mestre, apenas retribuia a cada um na medida da paixão pelo conhecimento que conseguia despertar em mim. Meu modelo didático foi um professor de português que, ao longo dos sete anos do ensino médio, raras vezes deu aulas de gramática por detestar as regras linguísticas. Mas, como em compensação, amava a literatura, nos contava os enredos dos romances, nos estimulava a ler livros e a debater seus conteúdos em sala. Com ele aprendi que aprender gramática se aprende na prática de leitura e de escrita. Tive também a sorte de ter como orientadores de pós-graduação historiadores que não se prestavam a psicografar minhas teses.
Dirão vocês que minha experiência não tem nada de diferente em relação ao que acontece ou à expectativa da maioria das pessoas, o que é a mais pura verdade.Todas gostariam de construir seu aprendizado sem constrangimentos nocivos, embora pouquíssimas consigam fazê-lo. Por que?
A escola, tal como a conhecemos, é herdeira da junção (nem sempre harmônica) de três sistemas disciplinares, originários da igreja, do estado nacional e o da organização industrial. Os currículos e as pedagogias atuais ainda carregam muito do peso dessas instituições. Queiramos ou não, ainda vivem da produção de receitas uniformizadoras, incompatíveis com as formas atuais de padronização e individuação.
Não é à toa que os estudantes detestam a escola. Não é à toa que ela se tornou obsoleta e violenta, no centro e na periferia. Se na universidade os alunos se distraem nas aulas a bordo de celulares, maconha, brejas e laptops, imagine-se o ambiente dos espertos jovens de hoje enjaulados em salas/celas fechadas. O único jeito é evadir e há muitas formas para isso, reais e virtuais.
Nada disso é novidade, convenhamos. O que é novo, mas temos medo de dizer - e sobretudo de praticar - são as possibilidades de autodidaxia abertas pela sociedade em rede. Não me refiro ao EAD conhecido nem às aulas-multimídia, instrumentos que até agora só serviram para dar aparência moderna ao velho sistema disciplinar. Há algo mais do que isso no espaço do imaginável e do factível. 
Teremos coragem de ousar experimentá-lo ou esperaremos a sua legitimação/consagração/disciplinação institucional? 
Estas linhas são somente um preâmbulo.