Como pretenso ovelha negra da família, às vezes me rebelo contra o papo institucional da minha profissão - para não dizer disciplina ou discurso, palavras muito pomposas e autocentradas. Estou passando por um momento desses, exatamente agora em que preparo o roteiro de um curso na pós-graduação para o presente semestre. Um curso experimental, diga-se de passagem, sobre o que mudou e muda na apreensão do tempo, na escrita, na leitura - e por que não dizer - na própria natureza do pensamento histórico com o advento e aceleração das tecnologias, em especial, cibernéticas.
Ocorre que não quero ir pelo caminho da História das práticas de leitura, hoje uma tendência carne de vaca na historiografia, que pouco acrescenta ou instiga. De posse desta negativa, fico a perambular por livros de outras áreas (filosofia, antropologia, psicanálise, por exemplo), que embora não fixem verdades, facilitam o livre pensar, o imaginar, o refletir sem freios.
Tem hora que eles desembocam em especulação futorológica (que mal há nisso?), noutras afiam utopias semipossíveis ou, ao contrário, azedam os ingredientes do pessimismo. Apesar disso, bons autores de uma ou de outra tendência concordam no alerta de que já vivemos a transição para uma pós-humanidade cujo impulso intrínseco desloca, de forma contínua e veloz, nossas antigas e ainda atuais modalidades de lidar com a escrita, a leitura e a percepção do tempo histórico. Para além do que disseram as vanguardas modernistas das artes, da literatura e da física.
Só isso já é um imenso desafio para o historiador de hoje, inteiramente desprovido de ferramentas analíticas que possibilitem analisar um tal fenômeno que não nos é exterior. O que oferecem os historiadores a semelhante desafio, além das velhas aberturas periféricas da Nova História? Nada, a não ser a solução-clichê de historicizar (palavra horrível) os fatos e os processos históricos. O que equivale a dizer, situar as mudanças técnicas, sociais e culturais em seus contextos, compreender sua dinâmica. Nada mais.
A História, para os antigos, servia como exemplo. De vida para seguir como modelo ou de experiência a ser repelida no presente. Para o indivíduo contemporâneo, que se descarta a cada dia de tecnologias obsoletas - cds, computadores, gravadores, ipods e ipads - assim como rejeita a importância de qualquer valor do passado (exceto o seu atributo turístico), não há lição a seguir.
O que será, então, historicizar senão uma maneira de se enraizar na ordem do já vivido, na medida em que só permite falar do que foi, nunca do que é ou poderá ser? Não teria a História se transformado num saber puramente consolador, destituído de exemplo e de potência de vida? Pergunta mais velha que a própria História, já respondida tem mais de um século por Zaratrusta.
E contudo a História segue...não é o fim da História,qual o seu fim sim, é o que procuramos novamente.
ResponderExcluirQual é o tempo da História, hoje, se ontem, na velocidade que vivemos, aconteceu há séculos...